quinta-feira, 28 de outubro de 2010

PALAVRAS DO POVO


Nos meus lábios
o silencio
das palavras pensadas,
palavras caladas
por não serem ditas.
Palavras mordidas
sílaba a sílaba
pela desventura
de ser povo
e ser anónimo.
Respostas duras
aos que falando,
mentem a si próprios.
 

domingo, 8 de agosto de 2010

ATÉ SEMPRE CAMARADA


Repara CAMARADA e AMIGO, até o céu se tingiu um pouco de vermelho em tua homenagem.
Unidos como os dedos da mão, seguimos em frente até à vitória final.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

INSENSATEZ DE MIM



Eu sou como as arvores!
Preso à terra,
nu, vestido de folhas,
roupa que mudo
conforme as estações.
O meu corpo
é da cor dos chãos que piso,
castanhos, vermelhos
pretos ou amarelos
de acordo com o rincão
deste mundo onde vivo
e em que as minhas raizes
primordialmente
se prenderam.
Também sou branco,
frio, cobrindo e moldando
tudo a que me sobreponho
e o que toco transformando.
Roubo a paz
que ancestralmente
existiu entre o meu eu
e mim próprio,
desvastando-me em guerras
numa luta de espécies
sem nexo, como se a terra
não fosse suficientemente
farta
para os meus eus
e as arvores
com que me pareço.
Nuas, presas à terra,
vestidas de folhas que mudam 
 conforme as estações.


sábado, 26 de junho de 2010

POEMA À BOCA FECHADA




Não direi:
Que o silêncio me sufoca e amordaça.
Calado estou, calado ficarei,
Pois que a língua que falo é de outra raça.

Palavras consumidas se acumulam,
Se represam, cisterna de águas mortas,
Ácidas mágoas em limos transformadas,
Vaza de fundo em que há raizes tortas.

Não direi:
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem,
Palavras que não digam quanto sei
Neste retiro em que não me conhecem.

Nem só lodos se arrastam, nem só lamas,
Nem só animais bóiam, mortos, medos,
Túrgidos frutos em cachos se entrelaçam
No negro poço de onde sobem dedos.

Só direi:
Crispadamente recolhido e mudo,
Que quem se cala quando me calei
Não poderá morrer sem dizer tudo.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

JOSÉ SARAMAGO, diria melhor do que isto



Querem colocar-me, em cinzas,
não sei onde.
Pensam assim prender-me
em qualquer lado.
Perdoo-lhes porque não sabem
que fazer de mim.
Coitados!
Mesmo morto,
do material,
de mim nada resta
nem nas cinzas eu estou.
No imaterial,
eu sempre estarei para além
de onde me colocarem.
Deste Mundo e do Outro,
eu estarei Na noite
Levantado do Chão.
Eu estarei nos Poemas Possíveis.
Eu estarei e sou o José
de Todos os Nomes
eu estarei para além
do Ano da morte de Ricardo Reis.
 O Baltasar Sete-Sóis
do Memorial do Convento
eu serei
e com ele construirei
a Passarola do Padre Bartolomeu.
Eu estarei acompanhando
o Elefante na sua viajem
e Provavelmente Alegria
estarei na Jangada de Pedra
ouvindo Jesus Cristo
ler o seu Evangelho.
Coloquem-me onde entenderem.
Façam-no e aprendam como eles
do Ensaio sobre a Cegueira.
Eu estarei sempre para além
do sítio onde me quiserem prender.


sexta-feira, 18 de junho de 2010

JOSÉ SARAMAGO



Morreu José Saramago!


A cutura dos povos de língua portuguesa ficou mais pobre.
Não serei pretensioso se disser que a cultura neste mundo global também ficou mais pobre.
E se com os sacrificios de "todos" (dizem), podemos sair da crise económico-financeira em que caímos, já na crise de identidade cultural para que caminhamos,
cabe aos que por cá ficaram não perder o legado que nos foi deixado por José Saramago, legado esse reconhecido a nível do mundo global.
A lucidez do seu "Ensaio sobre a Cegueira", prova-nos que a controversia gerada, quer pela sua obra, quer pelas opiniões emitidas quando entrevistado, que a forma como ele, homem da cultura, entendia como deveria ser o mundo à sua volta não sofreu desvios com a fama.  Nem ele, Saramago, perderia, até ao seu final, a sua verticalidade.
A todos irá acontecer o mesmo, só que nem todos terão a tua grandeza.
.........

Mas quando no teu destino
te calhou em sorte
conhecer seu rosto,
sei que quando chegou
te disse sorrindo,
És meu,
venho buscar-te,
Eu sou a Morte!

sábado, 24 de abril de 2010

OS ROSTOS DA REVOLUÇÃO












São rostos da revolução
e outros
não sejam aqui colocados,
porque a outros,
apesar de Abril chamados,
a eles não lhes foi dado
merecimento para tal
nos cravos da revolução
que nesse Abril nasceu
em cravos mil de alegria
e que a todos nós encheu
de esperança em Portugal.
Mas o povo não sabia
que havia outros rostos
onde neles se encobria
com fingimento, o desgosto
de estar a ver nesse dia
o seu regime deposto. 
Nesses rostos o que corria
não tinha sabor a sal
por eles só deslizava
com uma raiva brutal
ganância poder e ódio,
mas nas lágrimas de alegria
que o nosso povo chorava
o que no rosto escorria
era cloreto de sódio.
Foi uma esperança agredida
uma revolução adiada
pela ganância marcada
do poder, meta atingida.
Porém,
há por direito outros rostos
na nossa revolução,
anónimos,
por terem sido afastados
pelos tais contras, infiltrados,
 lacaios da reacção.
Mas esses rostos anónimos
apesar de afastados,
irão ser sempre lembrados
por servirem a Nação






segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

MESA VAZIA



Sete crianças
à volta da vastidão da mesa.
A mãe.
Como sempre a reza.
O Pai-nosso, sem ser todo dito.
Pai-nosso que estais,
do céu valei a todos os aflitos,
o pão nosso de cada dia,
nos dai hoje
na minha mesa,
esta vastidão vazia.
Eu, as crianças
não posso vê-las
assim
Te rezo o Pai-nosso,
Te rezo por elas
não por mim.
Uma das crianças pede,
baixinho,
mãe,
tenho fome,
dai-me de pão
ao menos um bocadinho.
Uma lágrima
rola pela face esguia
que estende o braço curto,
demasiadamente curto,
para a vastidão
daquela mesa vazia.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O FADO


O fado
não é destino marcado
que cada um traz gravado
no acto de se nascer.
O fado
é o rumo, a nossa vida
é mais a vida sofrida
que nos obrigam a ter.
O fado
é uma canção magoada,
uma revolta chorada
de quem não deixam viver
O fado
foi uma forma encontrada
de teres a boca fechada
de teres olhos e não veres.
Cuidado
que o fado não são só dores
prestamistas, desamores,
santos, virgens e romeiros
o fado
também é canção de luta
nesta terra prostituta
que se rendeu ao dinheiro.
Cuidado
que o fado
não é canção nacional,
é canção universal
e pertence ao mundo inteiro.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

À NOSSA VOLTA




Pelo cantar do vento
por entre as folhas
se pode sentir a arvore.
Se escutarmos com atenção,
ouviremos a arvore rir
brincando com seus rebentos